domingo, 21 de março de 2004

Confissão da alma do vizinho

Caros vizinhos, peço desculpa pela ausência mas fui passar o fim de semana ao Alentejo e não tinha acesso á net.

Posto isto... o post:



Nunca aqui falei de mim. Este blog é o blog de um vizinho bem disposto, amigo da vizinhança... mas anónimo.

Hoje pela primeira vez apetece-me desabafar, abrir uma pequena fresta na janela da minha alma e compartilhar convosco o turbilhão de sentimentos que me inundou o coração durante o fim de semana.

O meu pai morreu subitamente há pouco mais de um ano. Era mecânico e, desde a sua morte, na oficina tudo estava exactamente como ele tinha deixado. Mesmo quando algumas vezes tive necessidade de usar uma ou outra ferramenta voltei a colocá-la exactamente no sítio em que ele a deixara. Se estava desarrumada eu deixava-a lá onde as suas mãos a tinham deixado. Não me perguntem porquê.

Opostamente a mim, a minha mãe pedia-me constantemente que encaixotasse tudo e que deixasse aquele espaço vazio das suas recordações. Para ela, que vive naquela casa, era muito doloroso encarar diáriamente a ausência de quem ali estivera durante décadas.

Durante todo este tempo inventei mil e uma desculpas para não ceder aos seus pedidos.

Este fim de semana decidi finalmente começar a desfazer a oficina que o meu pai tinha ido construindo ao longo de uma vida.

Depois de desmantelar e encaixotar grande parte das ferramentas, sempre com um nó na garganta, dirigi-me ao cemitério e fui pedir desculpa ao meu pai. Pedi-lhe que me perdoasse esta quase traição.

Os homens também choram. Acreditem que sim.




Até amanhã, vizinhos.

Vou pra dentro tentar descansar.

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