quarta-feira, 15 de abril de 2009

Turismo Rural é que está a dar !


Se há um negócio rentável actualmente é o do turismo rural.
Trata-se de um desporto nacional que antes se chamava "ir à terra."
A diferença é que, se fores para a tua terra natal é gratuito, e se o fizeres para uma terra que não é a tua pagas como se fosses para as Caraíbas!
Para fazer turismo rural não serve qualquer aldeia. Tem que ser uma aldeia “típica”.
E o que é uma uma aldeia “típica”?
Uma aldeia típica é uma aldeia que aparece num Guia de Aldeias Típicas!
Óbvio, não achas !?

O acesso a uma aldeia típica faz-se normalmente por uma estrada típica, que é uma estrada com muitos buracos e curvas de forma que, quando chegas à aldeia tudo o que mais desejas é não ter que voltar a usá-la. Primeira evidencia do uso do Marketing!
A primeira coisa que fazes é entrar na tasca e tentar confraternizar com o “povo típico”.
- Bons dias, amigos! O que é típico aqui?
E o dono da tasca pensa: "Bem aqui, o típico é que venham totós da cidade pagar mil euros por um fim de semana!”

O passo seguinte é alojar-se numa casa rural, ou seja, uma casa típica, que é uma casa velha com paredes adornadas com velharias, e que não tem televisão, nem rádio, nem microondas. Mas tem montes de moscas, melgas e mosquitos que à noite, fazem mais barulho do que uma Zundapp a escape livre.
Então apercebes-te que muitas das pessoas da aldeia ivem em casas que não são nada típicas. Mas têm piscina, jacuzzi, parabólica, internet e portão automático.
A tua casa é típica, não tem portão automático, mas tem uma chave típica, enorme, que pesa mais que o Jô Soares.
Outra vantagem do turismo rural é que podes escolher entre alugar uma casa vazia ou viver com os proprietários. Esta última opção é verdadeiramente agradável.
Vais de férias e além da tua família ainda tens que aturar outra que nem conheces.
Quando chega a noite tu queres ver o futebol, o dono da casa quer ver a novela, e surge dúvida:
- "Quem manda mais, eu que paguei os mil euros ou este homem que mora aqui?
E ganha ele… porque tem a espingarda.

Vais também descobrir que podes participar nos trabalhos do campo.
O que significa simplesmente que te acordam às cinco da manhã para ires ordenhar uma vaca. Achas isso bem?? É como ires a uma estação de serviço e teres que ser tu a meter a gasolina, ou como ires a um McDonalds e teres que ir buscar a comida e no fim despejar o lixo… ou seja, é o costume! E pronto, levantas-te às cinco para ordenhar as vacas. E penso eu: Porque cargas d'água tem que ser tão cedo? Às nove o leite ainda continua lá, porra !
Há alguma lei que diga que as vacas não podem ser ordenhadas depois do pequeno-almoço? Penso que é incomodar por incomodar, porque para a vaca deve ser traumatizante que a acordem às cinco da manhã para que um estranho lhe apalpe as mamas. Ela deve pensar: "Ó estúpido, se queres leite vai ao frigorífico e deixa de ser tótó!"

Mas o realmente "típico" são as "actividades ao ar livre".
Como por exemplo quando vais fazer “caminhadas”. Ou seja... andar. Portanto, ir colocando um pé á frente do outro até não aguentares mais. Isto enquanto os “típicos” habitantes da aldeia passam por ti sorridentes num todo-o-terreno com ar condicionado e música rap.
Mas tu estás feliz. Percorres o campo como se estivesses no paraíso. Tudo te parece lindo e bucólico e até ao veres uma bosta de vaca irás exclamar:
- Humm que cheirinho típico de aldeia!
De aldeia? Uma aldeia não cheira a merda!
Ah, mas atenção, aqui cheira a merda típica…

Depois achas divinal uma refeição constituída por um pedaço de pão e chouriço.
Não poupas nos elogios:
- Em Lisboa, não se come pãozinho deste! Em Lisboa não se come chouriço deste! Em Lisboa não se bebe coca-cola desta!...
E perguntas ao empregado:
- Este chouriço é caseiro, não é?
- Sim, sim… foi feito dentro de casa! (...na fábrica!)

De repente ouves um sino a dar as horas e ficas extasiado:
- Ah!!! Que maravilha! Não há nada como o toque de um sino típico de aldeia!...
E alguém te responde: É gravado!
Nesse momento começas a questionar se os sons de passarinhos e grilos que tens ouvido não serão de um CD “Rural Mix 2008 - Os 101 maiores hits rurais”...
Mas de uma coisa tens a certeza, as melgas são verdadeiras. Ao fim da primeira noite já parece que tens varicela, com tanta borbulha!

Eu estou convencido de que, de segunda a sexta, as pessoas vivem nestas aldeias como todos nós, mas ao fim de semana colocam vigilantes na estrada, vestidos como pastores, e quando vêem um carro aproximar-se, avisam a aldeia através do telemóvel.
Então rapidamente substituem a placa a dizer “videoclube” pela que diz “artesanato”, metem lá um fulano a fazer sandálias de couro (que vende mais caras do que uns ténis Nike topo de gama) largam uns cães coxos nas ruas, e colocam uns quantos velhos no largo da aldeia a jogar dominó.

De qualquer forma, eu acho que uma encenação tão grandiosa não é feita sem colaboração das autoridades. Tenho a certeza que o presidente da junta dirige o show.
- Queridos conterrâneos: este Verão, para aumentar o turismo, vamos importar mais mosquitos da Amazónia, que no ano passado foram um sucesso. E quero-vos todos a usar boina, nada de bonés da Adidas. E não se esqueçam de andar com barba de três dias e roupas velhas. As velhotas do lar da terceira idade não devem ir fazer topless para a praia fluvial porque espantam os mosquitos. Ah, e não é necessário que ninguém faça o papel de “maluco” da aldeia… deixem isso para os totós do turismo rural !

Até logo, vizinhos.
Vou pra dentro.

2 comentários:

Susana Nova disse...

Simplesmente genial.

Muito bom!!!

Realmente o tirar o leite tão cedo sempre me fez confusão... é como ir pescar de madrugada.

Carlos C disse...

Caro Vizinho
Tu hoje estás muito acido, só vês o falso tipico e exageras um bocadito ... que se passa, estives-te a ouvir o "Senhor Engenheiro" ?

No entanto o texto tem piada, e visto pelo prisma do "falso tipico" para enganar os "gajos da cidade" tens razão sobre alguns exageros que por esse país se fazem.
Existe uma lei da oferta e da procura, e os ambientes tipicos tem bastante procura pelo que não admira que o citadino de barriga e ténis de marca seja enganado porque não soube distinguir na oferta o genuino do "falso tipico".

Um abraço